Se existe uma pergunta que pode mudar completamente a forma como treinamos, talvez seja esta: “Quem são os seus atletas quando não estão competindo?”
Porque, se a resposta for apenas “jogadores”, “competidores” ou qualquer definição restrita ao que fazem dentro do campo, talvez algo essencial esteja passando despercebido.
O esporte tem um jeito curioso de nos fazer acreditar que desempenho e técnica são os fatores supremos da equação. É claro que são fundamentais. Mas, se fosse só isso, atletas tecnicamente perfeitos jamais enfrentariam crises de confiança, falta de motivação ou estagnação. E sabemos que enfrentam. O que acontece fora do campo, na vida, na mente e nos relacionamentos desses atletas, pode ser tão determinante para o resultado quanto qualquer habilidade técnica treinada exaustivamente.
E aí surge uma questão essencial para qualquer treinador: você treina o atleta ou a pessoa?
Treinar é mais do que corrigir movimentos, montar estratégias e planejar treinos. O esporte é feito de pessoas, e as pessoas não são planilhas previsíveis. Por trás de cada jogador, há histórias, sonhos, inseguranças, formas únicas de lidar com desafios. Alguns precisam de mais estrutura, outros de mais autonomia. Alguns rendem melhor sob pressão, outros travam. Há quem precise de incentivos constantes e quem se motive pelo desafio silencioso de provar algo para si mesmo.
Ignorar isso pode ser o primeiro passo para criar atletas desconectados, que cumprem rotinas mecanicamente, mas perdem o brilho nos olhos. Por outro lado, entender a essência de cada um, sua forma de pensar, se relacionar, lidar com erros e buscar motivação, pode ser o que diferencia um bom treinador de um treinador que transforma carreiras.
E é aqui que entra um ponto crucial: a maneira como você treina os seus atletas reflete mais no desempenho deles do que qualquer outra coisa.
Na prática, existem dois tipos de treinadores: aqueles que apenas extraem desempenho e aqueles que o constroem.
• O treinador transacional é aquele que foca no curto prazo. Ele se preocupa apenas com a próxima competição, com as execuções corretas, com os resultados imediatos. Ele ensina técnica, dá feedbacks diretos, estabelece regras claras. Não há nada errado nisso. Mas quando o desempenho do atleta oscila, e inevitavelmente oscila, ele tem poucas ferramentas para entender e intervir além da questão técnica.
• O treinador transformacional, por outro lado, vai além. Ele entende que o jogo não começa no apito inicial, mas muito antes, na forma como o atleta se sente, se vê e se posiciona diante dos desafios. Ele não apenas treina habilidades, mas molda percepções, ensina a lidar com a pressão, ajuda a construir um senso de propósito dentro e fora do esporte.
A diferença? Atletas que não apenas jogam bem, mas que jogam com sentido.
Muitos treinadores acreditam que o que acontece na vida pessoal do atleta não deveria ser assunto deles. Mas o que acontece fora do campo não fica fora do campo. Um atleta inseguro, que enfrenta conflitos internos ou que perdeu a conexão com o que faz, carrega isso para o jogo, para os treinos, para cada decisão dentro da competição.
E isso significa que um treinador que se propõe a entender seus atletas além das métricas pode não apenas melhorar o desempenho, mas prolongá-lo. Porque atletas que se sentem compreendidos e valorizados não apenas se dedicam mais, mas também se permitem crescer de verdade.
O que isso exige?
• Ouvir mais do que falar. O atleta precisa ser enxergado como alguém além do uniforme. Suas dificuldades fora do esporte podem dizer muito sobre seu comportamento dentro dele.
• Adaptar a comunicação. Não é sobre falar mais alto ou mais firme, mas sobre entender como cada um recebe e processa as mensagens. Para alguns, um puxão de orelha funciona. Para outros, a melhor forma de ajuste é o incentivo.
• Ser um facilitador, não apenas um comandante. Bons treinadores não criam dependência, criam autonomia. O atleta precisa aprender a se conhecer, a entender sua própria mentalidade, seus próprios gatilhos de motivação e confiança.
O que realmente define o impacto de um treinador na vida de um atleta não é apenas o quanto ele ensina, mas o quanto ele consegue se conectar. Alguns atletas lembrarão das conquistas, dos treinos, dos desafios. Mas todos, sem exceção, lembrarão de como foram tratados, de como se sentiram ao longo do processo.
E talvez essa seja a parte mais importante do trabalho de um treinador: construir atletas que não apenas executam bem, mas que se tornam melhores por terem passado pelo seu treinamento.
No fim, todo atleta se aposentará. O que ele levará da experiência?
A resposta a essa pergunta pode ser o verdadeiro legado de um treinador.
No ambiente esportivo de alta performance, a comunicação entre os membros de uma equipe multidisciplinar é um elemento essencial que vai muito além de simples trocas ...
O recovery social é um conceito que talvez não seja tão familiar no mundo do esporte, mas sua compreensão e integração são cruciais para o sucesso e bem-estar dos ...